Capítulo XXVII - TONHO

1.7K 259 58
                                    


Alguma coisa estava errada naquela manhã.

Notei isso enquanto cumpria meu ritual matinal de desenhar o nascer do sol. O sono me abandonara muito mais cedo do que eu queria, como de costume. Sentei-me na calçada, como fazia todos os dias, mas a Sara não se juntou a mim. Em quatro meses era a primeira vez que isso acontecia, o que me fez ficar atento.

Quando eu me dei conta de que ela não viria mesmo, fui atrás dela. Alguma coisa estava errada e eu precisava descobrir o que era.

Abri a porta do quarto e a vi deitada ao lado da Helô. Meus sentidos – que estavam em alerta – se acalmaram um pouco e notei que tudo estava bem. Era bom saber que ao menos alguém tivera uma boa noite de sono.

Desci novamente e resolvi buscar o café da manhã. Minha transmutação era bastante útil neste caso e, mesmo que tivéssemos combinado de só fazer isso em duplas, eu sabia que nada de mau aconteceria comigo.

Peguei pães doces, suco e um cookie pra Helô e já estava entrando em casa quando a vi, sentada na cozinha de papo com a Iolanda. Achei que meu coração fosse explodir de tanta alegria. Era a primeira vez em quatro meses que eu via a minha irmã fora da cama antes de alguém trazer o café da manhã.

- Que bicho te mordeu? - perguntei, sem conseguir esconder o sorriso.

- Eu também não entendi nada – sorriu a Iolanda.

- Vocês estão reclamando? - tornou a Helô, fazendo graça. - Eu volto pra cama então.

Sentei ao lado delas e passamos boa parte da manhã rindo e comendo o que eu trouxera. Eu estava tão feliz, que aquele pequeno alerta que se acendera mais cedo estava totalmente desligado. E acho que foi por isso que a pergunta do Tião me pegou de surpresa.

- Vocês viram a Sara?

- Quando eu levantei, ela ainda estava dormindo – contou a Helô.

Levantei apressado e subi até o quarto. A Sara não fazia o tipo dorminhoca, por isso eu tinha certeza que alguma coisa tinha acontecido.

Bati na porta e, como não tive resposta, abri devagar, para não pegá-la de surpresa num momento que eu não deveria presenciar. A Helô tinha razão. Ela ainda estava deitada.

Abaixei-me para poder chamá-la, mas ela estava coberta até a cabeça. Tirei o cobertor de cima dela e a chacoalhei de leve.

- Anda, Sara...

- Eu não estou me sentindo muito bem – disse, meio grogue. - Eu vou ficar aqui mais um pouquinho.

- O que você tem? - perguntei, enquanto instintivamente levei a mão a sua testa. - Caramba, Sara! Você está ardendo em febre.

Considerando a vida que nós levávamos, era uma raridade um de nós ficar doente. Volta e meia pegávamos um resfriado ou algo do tipo, mas nada grave.

- O que aconteceu? - perguntou a Helô, colocando a cabeça pra dentro.

- A Sara não está bem – respondi. - Encontre a Mag e a traga aqui o mais rápido possível.

A Mag poderia curá-la assim que chegasse e foi por isso que eu não me preocupei.

- A Helô foi atrás da Mag – expliquei, sentando-se ao seu lado. - Logo você estará melhor.

Ela concordou com um aceno de cabeça e virou para o lado. Mesmo estando totalmente coberta, notei que ela tremia, o que só aumentou a minha tensão.

*

- Como assim a Mag não está aqui? - perguntei, tentando conter o desespero.

Enquanto a Helô fazia vigília no quarto da amiga, estávamos do lado de fora do quarto.

- Eu já procurei ela por todos os lugares possíveis, Tonho – explicou a Iolanda. - Ela simplesmente sumiu.

- Ela e o Joca, diga-se de passagem – completou o Tião.

Suspirei fundo pensando numa maneira de resolver mais esse problema.

- Iolanda, eu preciso que você vá até a farmácia e traga alguma coisa pra Sara – pedi.

- Tudo bem – respondeu prontamente.

- O Tião vai com você.

Notei a cara de quem não gostou da ideia que os dois fizeram. Mas eles sabiam que era um caso aparte, por isso não reclamaram.

Voltei para o quarto e encontrei a Sara deitada sobre o colo da Helô.

- O que a gente faz agora, Tonho?

- Vamos tentar abaixar a febre dela – respondi.

Corri até a torneira do beco e tentei juntar água em um pote que eu achei na rua. Rasguei um pedaço da minha camiseta e voltei para casa. Eu já tinha visto isso em filmes, quando eu ainda era muito pequeno.

Molhei o pedaço de pano na água fria e entreguei para a Helô.

- Coloca na testa dela – orientei.

Sem perder tempo ela fez o que eu disse, enquanto a Sara tentava tirar a compressa a todo custo.

- Isso está gelado! - exclamou, com o mesmo tom grogue de antes.

- Essa é a intenção – explicou a Helô.

- Mas eu estou com frio – reclamou.

- Se a gente não fizer isso, a febre não vai baixar – disse sério. - Agora colabora por favor, que meu dia já está bem estressante.

Ela pareceu entender meu apelo, mas admito que senti pena dela. Ela tremia tanto que chegava a bater queixo. E enquanto o mundo desabava sobre a nossa cabeça, tudo o que eu queria era saber onde diabos a Mag se metera.

*****************

Onde a Mag se meteu?

Não esqueçam do votinho e dos comentários.

Beijão e bom final de semana!

As Últimas Cobaias - Livro 3Where stories live. Discover now