O enterro de Justina

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Poucos minutos após a notícia de que Scarlett havia aceitado o acordo, aqueles escravos partem em marcha rumo a casa grande para pegar o corpo de Justina e realizar o seu funeral em um belo bosque que ficava próximo a uma das senzalas dos escravos.

No meio da marcha, eles cantavam músicas típicas daqueles grupos e por liberdade, em homenagem a Justina que através da sua coragem demonstrou que a liberdade era possível aos negros, pois eles eram a maioria e poderiam lutar por uma vida melhor.

Ao chegarem na porta da casa grande, Scarlett estava em seu quarto e ficou assustada com aqueles fortes gritos de liberdade. Aquela senhora ficou preocupada e com medo daqueles escravos se revoltarem, quebrarem o acordo e invadirem a casa para matá-la naquele dia.

Homens de palavra, os escravos foram então naquele porão, pegaram o corpo de Justina que estava envolvido a um pano branco cheio de folhas cheirosas e a retiraram daquele espaço para lhe dar um enterro digno da guerreira que ela demonstrou ser. No cortejo, estavam presentes, praticamente, todos os escravos daquela fazenda, inclusive Artur e Albertina que não paravam de chorar, já sentido a saudade daquela mulher, que havia se tornado uma verdadeira heroína no imaginário daqueles escravos.

Eles chegam então ao bosque, local do enterro e começam a realizar danças e rituais típicos dos negros, visando purificar o corpo de Justina e prestar as últimas homenagens a ela. Depois de alguns minutos, eles então abrem o espaço para enterrá-la e colocam o seu corpo naquele local. Com muita emoção de seu filho e sua irmã, que choravam muito, eles jogam a terra sobre o corpo daquela mulher, que foi completamente coberta e enterrada. 

Daquele momento em diante, a história de Justina ficaria marcada como um ato de resistência para aquele grupo de escravizados, que presenciaram todas as suas ações, tentando de alguma forma, demonstrar que aquelas ordens vindas de seus senhores poderiam ser contrariadas e que a vitória contra eles era possível.

Com o tempo passando, Justina era sempre lembrada e a sua história era passada de negro para negro, chegando a grande parte das fazendas da Bahia e de toda a região nordeste do Brasil. Os negros após conhecerem aquela história, se encorajavam a lutar também pela liberdade e muitas das lutas realizadas naquela região após a sua morte, ocorreram devido ao legado deixado por ela. Assim como Justina imaginava, os seus ideais encontraram um solo fértil entre os escravizados e chegaram também nas grandes cidades, como Salvador por exemplo, palco de grandes lutas pela liberdade dos negros, especialmente, encorajados pela sua história.

Obviamente, que essas histórias eram disseminadas, principalmente, entre os escravizados, pois, entre os homens brancos, assim como foi ordenado por Scarlett, aquela história foi rapidamente desmentida por todos que estavam presentes naquela fazenda e, desta forma, a versão oficial para os brancos foi outra. Para os homens brancos daquela sociedade, os trabalhadores da fazenda de Scarlett haviam morrido de doença e não assassinados por escravos em uma rebelião.

A oligarquia da época não tinha interesse que histórias de rebelião se espalhassem, pois, isso poderia incentivar novos escravos a criarem coragem e reagir ao péssimo tratamento que eram submetidos na época. Mas, entre os escravizados, essas histórias de heroísmo eram sempre espalhadas, chegando a longas distâncias e fertilizando o imaginário daquele grupo, com a mensagem de que a liberdade era possível. Para todos os grupos em que a mensagem de Justina chegou e encontrou terreno fértil o seu legado sempre se manteve presente e a luta pela liberdade se tornou uma busca constante, assim como era a sua missão.

Miss Scarlett e a escrava brancaWhere stories live. Discover now