Jantar para quatro

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Jantar para quatro



Capítulo 15

Na Capital...

Após o banho, vestem dois lindos vestidos e descem.

- Não deveríamos ter colocado esses vestidos para jantarmos com esses doutores advogados!
Aurélia olha para Letícia e novamente sorri:
- O que têm nossos vestidos prima?
- Ora, eles são belos demais para àqueles Advogados.
- Realmente, porém as doações e a comida que vamos comer, valem nossos esforços, já disse:
- Estou a morrer de fome!
- Então vamos logo, não quero ter que lhe fazer uma autópsia.
- Nem brinque com isso!

Elas descem o último degrau da escada do segundo andar e do lado de fora estão os dois jovens esperando-as.
Damasceno fala com um ar de riso:
- Pontuais, isso é deveras bom!
- Digo que se não fossem, Aguardaríamos com prazer;

Rebate Rodolfo.
Tentando agradar ao máximo as belas damas.

- Agradecemos muito, vamos?!
Ah, peço desculpas, essa é minha prima doutora Letícia.
- Prazer senhorita, sou doutor Rodolfo de Alencar.
- O prazer é todo meu.
- Sou doutor Damasceno Silveira.
- Advogado?!
- Sim!
- Que pena!
- Letícia minha amada prima, não constranja os doutores.
Pois eu já disse isso para eles...
- Não nos constrangeu de maneira nenhuma.
- Peço desculpas.
- Não há o que desculparmos, não é Damasceno?!
- Por certo que não!

As duas jovens sorriem, e ficam a espera dos senhores se manifestarem onde as levará para  jantarem.
Eles ficam olhando para as senhoritas e não dizem, palavra alguma por alguns minutos.

Aurélia é a mais desenvolta dos quatro, olha na face de todos e de súbito diz:
- Senhores, podemos ficar aqui sobre nossos pés em pleno silêncio, porém meu estômago disse-me que em poucos segundos  irá gritar.
- Mil perdões, aonde as damas querem jantar?
Ele não fechou ainda sua boca e chega a carruagem que havia alugado para levá-los.
- Não precisa de carruagem:
Diz Letícia olhando para Rodolfo.
- Faço questão.
- O restaurante é deveras perto.
- Não posso permitir que as senhoritas caminhem.
- É perto...
- Fazemos questão, senhorita:
Diz Damasceno.
- Ora, deixem de falatório, vamos!
E Aurélia entra rápido na carruagem.
- Está bem, mas ainda continua sendo perto.
Todos entram, Letícia da o endereço para o cocheiro, que toca o cavalo, vira a esquina e para em frente ao simpático restaurante com um letreiro em vermelho vivo escrito:

Restaurante Bom paladar.

- Não lhes disse que era perto?!

As duas descem sorrindo.
Rodolfo e Damasceno, que queriam pegar as mãos das jovens para ajudá-las à descer,
como é de costume para um cavalheiro, ficam atônitos e petrificados dentro da carruagem, logo após descem e pagam o cocheiro.

- Eu já disse alguma vez hoje que estou morta de fome?
- Mil vezes Aurélia.

Elas entram na frente deles no restaurante, os deixando perplexos por não conseguirem praticar o cavalheirismo com aquelas damas.

Fazenda Esmeralda...

O sol raiou, os escravos saem para mais um dia de labuta.
Essa manhã, em particular, o negro Leôncio acordou revitalizado.
Ele caminha com mais destreza e na frente do eito as enxadadas, são precisas e com uma força descumunal.
À cada vez que a ferramenta entra na terra, ele visualiza o pescoço quebrado e a espuma gosmenta saindo da boca do senhor Samuel.
O corpo do negro está automaticamente trabalhando no máximo.
Em seus pensamentos, a vingança será saboreada fria.

Na noite anterior...

As duas jovens senhoritas, visualizam uma mesa junto à uma janela, caminham até ela e assentam- se sorridentes.

Os dois amigos as acompanham em silêncio e assentam-se também.
- Boas noites, qual é o pedido?

Aurélia é a primeira a responder:
- Quero algo que encha o prato!
- O mesmo para mim: diz Letícia.
Os doutores trocam olhares entre si.
O jovem atendente sorri e diz para Aurélia:
- O mesmo de sempre, senhorita?
- Sim, Mauro.
O mesmo de sempre.
- Para eu também!
Diz Letícia.
- E para os cavaleiros?
- Se me disseres o que é esse de sempre, talvez peça o mesmo.
- Arroz, feijão, bife e batatas fritas.
- Quero o mesmo, por favor.
- Para eu também:
diz Damasceno.

O garçom sabe para fazer os pedidos a cozinheira.
Como os dois amigos haviam combinado, Rodolfo senta-se próximo à Aurélia e Damasceno próximo à Letícia.
O que eles não sabem é que as doutoras combinaram exatamente o contrário.
Com isso, as perguntas são feitas e as respostas cruzam- se.
- Vejo que as senhoritas são pioneiras em exercerem a medicina feminina no Brasil?
Pergunta Damasceno para Letícia.
Aurélia responde a pergunta:
- Deveras, nossos pais procuraram por todo o país universidades que nos colocassem em suas grades.
Todas às portas se fecharam, por sermos mulheres.
- Os cursos de medicina eram somente para homens.
- Nossos pais no levaram para cursamos na Europa, assim conseguimos concretizarmos nosso sonho.
- Senhorita Aurélia, vejo que as duas se dedicam à negros e pobres, isso não limita sua clientela?
As pessoas de classe média não vão à lugares que estão repletos de negros e pobres.
- Realmente, não nos importamos com esse tipo de pessoas.
Fomos criadas por uma família abolicionista, na qual a classe social ou a cor nunca teve importância alguma.
Nos dedicamos em sempre dar nosso melhor.

Rodolfo percebe que as duas jovens médicas, são pedras únicas e preciosas.
Na porta do restaurante, um negro de uns quarenta anos chega.
Ele está bem trajado, com um paletó bem passado.
Seu olhar se detém na direção da mesa onde se encontra os dois casais.
Ao verem o negro, as duas jovens abrem um enorme sorriso e dizem:
- Tio, venha para cá.
O negro também sorri com seus dentes brancos feito leite.

Maria Boaventura.

Espinhos da LiberdadeWhere stories live. Discover now