Dividas pagas

15 4 17
                                    

Dividas pagas

Capítulo 56

O ser humano não só pode, como deve mudar suas ideias e seus caminhos.
O bem nasce nos corações e floresce se isso a ele for permitido; o mal também floresce nos corações e gera grandes espinhos.
Senhor Damião, sempre foi fiel ao pai de Samuel e a ele igualmente, todavia, a dívida que Damião carregava consigo, mudo de dono quando a negra Ayana salvou a honra de uma das suas filhas e a vida das duas.
Nesse momento ele caminha para à fazenda Esmeralda procurando pagar a tal dívida.
Para isso, usará todas às maneiras possíveis para ajudar Ayana, esquecendo-se o juramento de fidelidade que mantinha com a família Albuquerque.

Fazenda Esmeralda...

Senhor Samuel está sentado no alpendre da casa grande, aguardando a chegada do meio dia para a reunião com seus colonos.
Ao alhar a estrada que trás a sua fazenda, vê ao longe um homem que vem cavalgando rumo a porteira, ao aproximar ele reconhece ser o senhor Damião.

- Bom dia, senhor Samuel!
- Bom dia, senhor Damião.
Que bons ventos o traz até Esmeralda?
- Trabalho, trabalho me fez sair do meu cantinho.
- Apeie e se achegue, venha tomar uma xícara de café quentinho da hora.
Depois vamos fumar um cachimbo.

Senhor Damião também tem esse vício não trivial, fuma esporadicamente, pois não gosta de faze-lo sozinho, mas quando se encontra com alguém que tem o mesmo vício, tira o cachimbo e o tabaco da guaiaca e se alegra dando fortes baforadas.
- Se assente, me diga o que o traz realmente por essas bandas?
- Estou passando por um grande aperto por falta de mão de obra, os poucos escravos que me pertenciam partiram, aí resolvi vir até aqui ver se o senhor não tem trabalhadores sobrando para me arrumar alguns.
- Quem me dera, meu amigo.
Hoje mesmo terei uma reunião com os italianos, darei minhas terras em porcentagem ou até mesmo a meia.
Não quero mais negros trabalhando em minhas terras!
E se não for dessa maneira, não conseguirei tocar minhas lavouras.
- Para meu amigo, que tem tantas terras cultivadas é uma ótima saída, para eu não funciona, tenho poucos alqueires cultivados e preciso de trabalhadores com urgência.
- Essas maldita libertação veio para acabar com todos nós latifundiários, ou qualquer dono de terras...
- Nós pequenos cultivadores, também estamos pagando o pato.
- Vamos mudar de assunto, como está a negra Ayana?
Ouvi falar que ela deixou o filho na roda dos enjeitados.
- Não me diga?! Ela foi embora tão logo soube da Liberdade, pegou o menino e partiu junto com os outros negros.
Não pude fazer nada, afinal, a guarda imperial mandou deixá-los partir...
- Aquela maldita guarda!
Fiquei sabendo que ela se livrou do negrinho.
- A negra deve estar passando necessidade, aí o motivo de abandonar a cria.
- Imaginei...
- Ela só falava no seu negro, imagino que foi procurar por ele.
- Ela não vai encontrá-lo!
Aquele bastardo, foi para a capital e amanhã bem cedinho irei atrás daquele infeliz dos infernos. Contratei um capitão do mato, vamos encontrar o maldito, voltarei com a cabeça dele em um saco de estopa!
- Depois do que ele fez com seu filho, não há nada mais justo!
- Isso ainda é pouco, a morte não é suficiente, vou fazer ele sofrer antes de arrancar sua cabeça do corpo.

Samuel ainda fala quando dona Beatriz aparece no alpendre.

- Bom dia, senhor Damião.
Ouvi o senhor falar de Ayana, tens notícias dela?
- Bom dia, senhora Beatriz.
Ela foi embora após a libertação, mas hoje tive notícias por seu marido.
- Você tem notícias dela, meu marido?
- Fiquei sabendo que ela colocou o filho na roda dos enjeitados e que foi para a capital atrás do negro dela.
- Ayana não entregaria seu único filho assim.
- Dona Beatriz, a fome, a falta de trabalho e as dificuldades estão fazendo muitas negras levarem os seus filhos para as irmãs de caridade, pois elas os alimentam.
- Pobre Ayana, o mundo tem sido muito cruel com ela.
- O mundo tem sido cruel conosco, mulher!
Permitiu que aquele negro matasse nosso filho!
- Nosso filho não foi o único que morreu, ela perdeu os três filhos de uma só vez.
- Cale-se! Entre agora! Mande a negra cozinheira fazer um café para nós.
Beatriz, não aponte sua cara mais aqui, vá logo!

Dona Beatriz se cala e sai.

- Essa mulheres pensam que podem falar e dar opinião em nossas conversas.
Ando amolado com a Beatriz...
Aproximando- se do senhor Damião diz:
- Preciso arrumar uma negra despudorada e muda de preferência.
Só assim ficarei satisfeito.
- Fazes muito bem, digo mais, seríamos mais felizes se todas as mulheres nascessem mudas.

Diz o senhor Damião, procurando ser agradável.
Samuel solta uma gargalhada, coisa que não se vê acontecer ultimamente.
Damião usa de astúcia para descobrir o máximo possível sobre a viagem de procura que fará o senhor Samuel.
Dizendo e concordando com todas as palavras ditas pelo fazendeiro.

Maria Boaventura.






Espinhos da LiberdadeWhere stories live. Discover now