Cachimbo

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Capitulo 31

Na Capital...

A capital do império, desde o dia da abolição, tornou-se reduto de milhares de negros libertos.

Todos buscam melhores condições para sobreviverem, precisam de trabalho para que possam se alimentar e alimentar os seus. Todos quanto podem, tentam ajudar os antigos escravos, dando-lhes alimentos, conseguindo trabalho ou indicando-os para algumas fazendas que se empenham em se adequar a nova condição. Muitos fazendeiros estão deveras irritados, não abrindo às portas para trabalhadores negros, somente para escarnece-se da cor, estão contratando italianos.

Os navios chegam abarrotados deles, que estão procurando trabalho e enriquecimento na nova terra. Com isso, a vida do negro se torna cada vez mais difícil...

Muitos estão sendo acusados de vadiagem, por perambularem de fazendas em fazendas, por não aceitarem os salários de misérias que lhes são oferecidos. Não poucos, dos antigos escravos deixam-se levar pelos vícios, dedicando seus dias a esmolar e beber água ardente, pensando assim, afogar seu novo e cruel destino.

A cúpula dos mais poderosos, reúnem-se buscando maneiras para continuarem escravizando os menos afortunados.

Entram com pedidos de guarda sobre os menores filhos dos escravos, dizendo da falta de condições para a criação dos tais. Conseguem perante alguns juízes, cartas para serem os tutores das crianças, retendo-os nas fazendas.

Os pais se obrigam a ficarem trabalhando para os seus antigos donos, pois não querem deixar seus filhos a reveria dos senhores carrascos...

Isso se tornou um novo tipo de escravidão latente.

A poesia nos corações daqueles que tanto lutaram pela liberdade e igualdade, já não tem o mesmo brilho e glamour...

Não se acha um responsável que tem o poder de inserir, ensinar ou introduzir a nova população liberta ao seio da sociedade...

A justiça, a igreja ou aqueles que comandam o império... deram aos negros a liberdade, os jogando sozinhos ao vento...

Sem rumo e sem diretrizes.

Liberdade que não liberta, felicidade que se torna em tristeza, flor que se torna em espinhos...

O sitio...

A cavalaria passa frente à pequena estrada que conduz ao sitio do senhor Damião.

- Tem um carreador aqui sargento!

Vamos ver onde vai dar?

- Temos que chegar à fazenda Mariana ainda essa tarde, por lá tem mais de duzentos negros...

Deixe essa trilha, ela não está em nossa lista, penso que não deve ter nenhum negro nesse buraco. Vamos!

O sargento cutuca a anca de seu cavalo e a tropa o segue...

Todos no sitio "Pouso alegre" ficam sem saber que não mais são escravos; e a vida continua normalmente...

O capanga do senhor Samuel parte de madrugadinha para cumprir o pedido de seu patrão. Ao chegar ao sitio, seu Damião e seus escravos já haviam partido para à lavoura. A menina Selma cuida do filho de Ayana enquanto ela lava roupas no rio.
O menino tornou-se uma distração para a garota, somente quando está brincando com a criança ela sorri, esquece o ocorrido e tem um pouco de alegria.

Dona Alma mantem um carinho pela negra e pelo filho.

Catarina tem todos os sinais de que está gravida, Ayana e a mãe dela já perceberam, porem estão quietas tentando poupar a jovem do duro martírio que irá passar quando vier a saber.

Um homem estranho chega e desmonta do cavalo próximo a entrada da casa...

Dona alma vem recebe-lo meio ressabiada.

- Bons dias, senhora!

- Bons dias!

- É aqui o sitio do senhor Damião?

- Sim. O que gostarias?

- Vim aqui a mandado do senhor Samuel, gostaria de saber se a escrava Ayana já pariu?

- Sim, o negrinho já nasceu!

O senhor Samuel disse-lhe mais alguma coisa?
Fez algum pedido?

- Não, somente mandou-me perguntar isso.

- Pois bem, diga-lhe que o negrinho já nasceu...

O homem monta novamente em seu cavalo e olha o menino branco nos braços da menina.
Pensa ser neto de dona Alma...

Pega na ponta de seu chapéu e com um cumprimento sai trotando de volta para Esmeralda.

Dona Alma o observa até que ele suma no horizonte.

No rio, a negra não viu nada...

Catarina senta-se na beira do barranco e conversa com Ayana.

- Não tenho me sentido bem! Estou tonta e os enjoos estão me matando.

As lagrimas descem de seus olhos...

- Não mintas para mim, sei que estou esperando um filho daquele monstro nojento!

- Menina Catarina, como podes saber disso?

- Ouvi a mamãe chorando durante a noite, papai também chorou e disse baixinho para ela que não vai suportar um neto negro!

Os olhos das duas mulheres vertem lagrimas, como se fossem cachoeiras depois de uma tromba d'água...

Elas se abraçam, o negro mesmo depois de morrer continua espalhando terror em suas vítimas.

Fazenda Esmeralda...

A negra cozinheira que foi contratada, está cuidando de tudo.

Dona Beatriz está se sentindo melhor nessa tarde, ela nega-se a olhar para seu marido, teme que ele se tornou seu falecido sogro, que a loucura tomou sua mente e ele resolva matá-la e também a suas filhas. Ele está sentado no alpendre balançando-se em uma cadeira, fuma um cachimbo, é um velho costume fumar, diz que esse vício o acalma.

Já se faz noitinha e o capanga chega...

- E aí, tens novidades para mim?

- Sim, senhor.

O negrinho já nasceu faz alguns dias.

- Você o viu, viu a negra?

- Não, falei com a esposa de seu Damião, ela me disse para lhe dizer, que o negrinho nasceu.

- Tens certeza que o moleque é negro?

- Toda certeza, a dona falou com cara de nojo que o moleque é negrinho.

Senhor Samuel senta-se na cadeira, dá uma baforada no cachimbo e fica pensativo...

9/11/21

Maria Boaventura.

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