Espinhos da Liberdade

Seguindo para Capital.

Seguindo para Capital

Capítulo 59

Fazenda Esmeralda...

Às onze horas da manhã, dona Beatriz os chama para o almoço...
Samuel e Damião se levaram e seguem para a sala de jantar.
O almoço é servido...
As três meninas de Beatriz almoçam em uma mesa na cozinha, ela, apesar de estar magoada e envergonhada pelo comportamento ignóbil do marido, senta-se com eles a mesa buscando saber algo mais sobre sua amiga Ayana.
O conversam sobre os negros, a liberdade, o fim iminente do império e sobre os italianos e a terra a ser dada em porcentagem...

O almoço está deveras saboroso e é elogiado por Damião:

- Estou me vendo sem opção, penso em arrumar uma família de italianos para me ajudar no cultivo do sítio.
- Não o aconselho, são uma raça difícil de lidar, falam pelos cotovelos; tendem a fazerem o que querem em lidar com o plantio como se estivessem na Itália.
Querem viver e andar com suas próprias pernas, isso não é bom para uma pequena propriedade.
Penso que a única forma de lidar com eles, é deixando eles plantarem e colherem e recolher deles a parte dos sereais que nos cabe por direito de arrendamento.
- É, não vejo saída para mim, terei que pagar salário para alguns negros e me contentar com o que me restar de lucro, isso se houver algum!
Se quiser cultivar minhas terras, não há outra maneira.
- Não quero nunca mais essa raça em minhas terras!
mas para o amigo, pode surtir efeito...

Ao chegar o meio dia, O senhor Samuel pede licença e sai para os lados da antiga senzala para a reunião. Senhor Damião se despede dele, antes de sair confirma a ida de Samuel para à Capital.
- Então, amanhã iras mesmo para à Capital?!
- Sim, logo pela madrugada parto.
- Tenhas uma ótima viagem, desejo que encontre o negro.
- Agradeço meu amigo...
Samuel sai para a reunião e Damião monta em seu cavalo para começar sua jornada de volta, antes dele sair e, vendo que Samuel já está no barracão, dona Beatriz diz:
- Senhor Damião, quando Ayana foi embora ela disse- lhes algo sobre a criança que teve?
- Algo? Perdoe-me, não entendi a pergunta.
- Quero lhe perguntar se a criança é negra, ou mulata?
Damião olha para os lados da senzala e medita...
Pensa em Gabrielzinho...
- O menino é a cara do pai, assim disse a negra quando o menino nasceu.
me desculpe senhora Beatriz, não tenho informações para lhe dar, não presto atenção nos negrinhos quando nascem.

Dona Beatriz não entende muito bem a resposta, porém quando ouve a palavra" negrinho" suas esperanças desvanecem...
Agradeço a atenção senhor Damião, de lembranças a dona Alma e às meninas.
Boa viagem de volta.
- Agradeço dona Beatriz.

Assim, senhor Damião parte de volta para o sítio.
Trazendo notícias para Ayana.

Na Capital...

Embora havendo se passado alguns meses da data da libertação, até o presente momento a vida dos negros e de toda a população continua um verdadeiro caos. Há àqueles que lutam para escravizar novamente os negros, usar seus serviços sem qualquer paga ou em troca de alimentação ou um teto sobre suas cabeças...
Não aceitam que aqueles que outrora lhes eram submissos em tudo, tomem conta de suas próprias vidas.
Há também aqueles que se adequaram à nova forma de viver, respeitam às leis, pagando pelos trabalhos prestados dando dignidade à raça negra.
A turbulência que a transição causa na vida dos negros e brancos, pobres e ricos faz com que muitos procurem defensores para que possam obter ganho para suas causas
Perante a justiça.
Pensando nisso, os doutores advogados José Jerônimo, Damasceno e Rodolfo, priorizando a amizade e também o parentesco, resolvem abrir um escritório de advocacia no centro da cidade do Rio de janeiro.

Doutor José Jerônimo é um advogado influente e sua forma de defender e de ganhar
causas, vem o tornando conhecido e requisitado por todo o tipo de clientela.
Já para os jovens advogados que estão em início de carreira, será um excelente aprendizado trabalharem ao lado de um profissional respeitado que impõe sua sapiência ante uma corte de juízes e promotores que por muitas da vezes, usam a cor contra as posses em seus julgamentos.

Três homens bem vestidos param frente ao prédio onde alugaram uma enorme sala no térreo. Os móveis estão colocados em seus devidos lugares. O letreiro acaba de ser pintado.
" Isonomia advocacia"
- O letreiro ficou magnífico!
- Realmente ficou. Diz Rodolfo, colocando sua mão sobre o ombro de seu amigo Damasceno.
- O letreiro está muito belo, porém minha preferência é a palavra nele escrita: - Isonomia" de agora em diante, nós três viveremos a essência dessa palavra, nosso escritório a terá como seu seu lema. Será nosso modus operante!
Não haverá distinções, não permitiremos que a cor da pele diminua ou aumente a verdade perante à justiça!
- Concordo! Afinal... A justiça tem o insigne dever de ser justa para todos!
- Justiça justa... Gostei!
Iremos lutar com todas as nossas forças para que isso se cumpra.

Os três homens entram juntos em seus escritório, assentam-se em suas escrivaninhas e aguardam seus primeiros clientes.

Santa Efigênia...

O negrinho cavalga a galope por todas as fazendas da vizinhança, conta para os fazendeiros o ocorrido, eles se reúnem e chamam a guarda imperial para os ajudar a preferem os ladrões e assassinos. O fato causou medo e raiva nos amigos do casal, que somente estão vivos por causa de um negro de bom coração; disse a esposa do dono da fazenda...
A noite está chegando e os batedores encontram os rastros do meliantes, logo julgam que vieram do assentamento dos negros libertos...
Acampam a uma certa distância somente aguardando o dia amanhecer.

A alva ainda não chegou e Leôncio e Miro partem para a Capital...

Homero acorda com os primeiros raios de sol, seu primeiro pensamento é Leôncio.
Ele vem para o barraco em que Leôncio e Miro pernoitaram. Por cima da esteira do negro Leôncio ele encontra o vestido e os dois contos de réis...
- É, Leôncio! Vejo que o coração de um negro forte, não se muda por nada!
Quem nasce tolo, morre tolo!
Balança a cabeça com indignação e parte para os lados que os negros guardaram a água ardente.

Maria Boaventura.