Sangue na manhã...

23 5 16
                                    


Capitulo 33

Na Capital...

- Fique essa noite conosco tio José, sei que moras muito distante, e não é bom andar por essa cidade essas horas da noite.

- Aurélia, não há problema algum, sou acostumado a tecer por essas ruas durante à noite.

- Isso poderia ser deveras verdade, antes da abolição dos escravos, agora está ocorrendo muitos assaltos e espancamentos, uns culpam os negros por tanta violência, outros culpam os senhores que perderam seus escravos...

Na verdade, não se sabe quem são os culpados! Ou todos são culpados?!

- Meninas, digo que a lei é a grande culpada desse impasse, pois não foi deliberada uma lei que socorresse os escravos nessa hora em que mais precisam, me pergunto: - Como eles irão viver sem à ajuda da coroa?

Eles não têm cultura, não têm especialização em nenhum trabalho, não têm ganho algum!

E seus filhos? O que irão comer ou vestir?

Realmente, essa lei áurea veio para tirar os negros do espeto e joga-los na brasa!

Fico indignado com o descaso de nossas autoridades.

Foi tudo bonito, tudo muito lindo...

Somente no papel!

Ninguém pensou nas vidas dos escravos libertos, pois o sofrimento continua, quiçá, se não estiver bem pior!

- Vejo isso, está impossível ver tantos famintos nas ruas.

Às crianças choram de fome, estão doentes e fracas!

- Mulheres outrora honestas... se prostituem, pois não tem o que comer!

O que podemos fazer? Na verdade, a pergunta é; quem pode fazer algo pela raça negra?

- É uma questão a ser discutida pelos governantes. Resta-nos ajudar o máximo possível, porém, sem se prejudicar.

Disse o doutor José.

- Tio, lembrei-me de algo...

Fui fazer uma visita para a baronesa Octaviana de Vertilhos...

Contei-lhe sobre o senhor e sua luta para conseguir se formar em direito.

Ummmm...

Ela se surpreendeu com sua história, deu-me esse bilhete e pediu-me para dar-lhe... é para meu digníssimo tio fazer-lhe uma visita, pois ela prioriza a cor e tem negócios pendentes que carecem de um olhar clínico, de um advogado; que pena!

Os três riem...

As doutoras convencem seu tio a pernoitar, ele agradece e dorme na poltrona da sala...

Fazenda Esmeralda...

Vários fazendeiros decidiram fazer uma reunião para polemizar sobre sua nova condição de empregadores.

Mesmo tendo se passado alguns meses, com a proximidade da colheita, às coisas não andam bem... Tendo sua maneira de viver, cauterizada pelo longo tempo do regime escravocrata no seio da sociedade em que sempre viveram, se livrar de tais costumes está sendo pesaroso para todos eles.

De quando em vez, um ajudante ou até mesmo os fazendeiros e senhores da digna sociedade de brancos, se pegam açoitando algum negro, isso vem causando muitas dores de cabeça para os donos de terras, pois os negros se revoltam e saem a procura de novos lugares para trabalharem. Existe em muitas localidades, negros que ficaram nas fazendas trabalhando da mesma forma que trabalhavam; viver é melhor que morrer...

Pensando assim, não se dispuseram a sair pelas estradas e vilas mendigando o pão de cada dia. O que para seus donos, tornou-se algo lucrativo, não perderam toda mão de obra e suas fazendas continuam mantendo seu ritmo de trabalho.

São sete horas da noite e a mesa do jantar está posta.

Dona Beatriz caprichou no jantar e todos se assentam à mesa para a reunião, ou para o jantar reunião...

- Senhor Samuel, o jantar está supimpa! Agradeça a sua senhora...

- Digo o mesmo, está um manjar para os Deuses!

- Senhores, convenhamos que não viemos aqui para enchermos a barriga, e sim, falarmos sobre nossas colheitas que estão às portas!

Disse o senhor Gustavo de Sousa e silva.

- Senhores, senhores! Tenho a lhes dizer que esse ano não vejo como derriçar meu cafezal, os negros não param no eito, todos os dias eles vão embora depois de receberem a miséria que lhes pago! Confesso, me tem ficado mais barato do que manter aquele monte de negros nas senzalas...

Porém, eles estão achando-se gente!

Pensam que podem exigir melhores condições e salários; vê se pode?!

- Amigos! Digo-lhes que todos os nossos governantes se juntaram para acabarem com nossas vidas, foi uma falta total de honra e dignidade... quero ver quem a de alimentar esse povo do nosso país, sem a mão de obra escrava, quem irá trabalhar?

Por certo que será eles!

- Agora temos que lidar com esses italianos dos infernos! Espeta um attino, stiamo arrivando!

Que merda é essa?! Já estou enlouquecendo!

- Calma senhor Roberto! Todos estamos sofrendo com essa transição.

E assim, a reunião se estendeu por horas a fio...

Lá pelas altas horas muitos já haviam partido, o senhor Joao Paulo Garcia, amigo de Samuel e dono da fazenda Rio do Ouro, conta para o amigo algo que descobriu por acaso...

- Antes de ir embora, quero te contar alago que imagino, seja de seu interesse.

- Pois me diga logo o que é de meu interesse!

- Aquele escravo que você tanto queria matar, está trabalhando em minha fazenda.

- O maldito Leôncio está em sua fazenda?

- Creio que sim, o negro está sempre junto com o negro Miro; que o chama de Leão, imagino que seja para disfarçar...

- Peguei o maldito!

- Então meu amigo, mate logo o negro e seja feliz novamente...

Você merece voltar a viver feliz.

Dizendo isso, dá dois tapinhas nas costas de Samuel e monta seu cavalo, e vai para os lados da estrada do pinho, onde sua fazenda fica.

- Você vai morrer negro! Eu vou beber seu sangue no café da manhã...

16/11/2021

Maria Boaventura.

Espinhos da LiberdadeWhere stories live. Discover now