Entre o Amor e a Amizade

Capítulo 89

A dor parece que é o único sentimento que consegue instalar em seu peito, sendo também sua infeliz companheira que não se cansa de martelar, martelar minhas lembranças doloridas.

Faz duas semanas. Duas semanas que ando com a cabeça erguida, empinada o suficiente para olhar para o céu e não para o rosto de Nathan, sempre que trombamos nos corredores.

Ando mais séria, sem sorrisos no rosto. Ando com saltos altos, roupas sociais e uma personalidade ainda mais difícil, com a cabeça cheia de gráficos e porcentagens de lucro, com horários, reuniões.

Faz duas semanas inteiras que me comporto como a Herdeira Hernandes. No começo papai me dava serviço de secretária, mas agora ele pede que eu faça resumos, analise gráficos e diga o que eu acho ser, o que devemos fazer para acabar com o problema das quedas de dinheiro nos dois últimos meses, bom, eu realmente estou trabalhando.

Minha vida social sumiu, mas todos os dias recebo mensagens da Mika, perguntando se estou bem, Mika ainda está moderada, ao contrário de Lupi que, acha que minha vida acabou depois que terminei com Nathan.
Faz duas semanas que explico para ela que minha vida não se resume num relacionamento, mesmo assim, continua a fazer as mesmas perguntas: Você tá bem? Precisa conversar? Olha você é bem mais bonita que a Helena.

Como se eu estivesse interessada em comparar minha beleza com a aparência da nova ficante do Nathan. Que os dois se lasquem!

Enquanto estou focada nos negócios da família, Nathan se diverte com Helena, a modelo varapau. Poderia dizer que estou incomoda, mas não estou. Não tenho o porquê ficar.

Reunião em cima de reunião. Parei somente duas vezes, uma para beber água e a outra para contatar o advogado do meu pai, tirando essas duas escapadas, não sai nenhum segundo a mais do lado do André.

Estou sentada de penas cruzadas vendo um idiota de um garoto tentar se passar por um homem mais velho em busca de empréstimo para construir uma boate.

— O que você acha? Vai me passar o empréstimo? ─ A impaciência transparece na voz do garoto. Meu pai tentando ser o mais paciente possível depois de ouvir um discurso pobre de um garoto que pretende não pagar juros em cima do empréstimo. Sei o quanto meu pai quer mandar esse moleque embora, só não entendo porque ainda não o fez.

— Rebeca, o que acha? ─ Papai aperta uma bolinha antiestresse.

Aperta, aperta e inclina o pescoço para trás, podendo enxergar o teto com maior facilidade.

— Não vale a pena. — Resmungo, cansada de ouvir argumentos sem senso, vindo do garoto que, me olha com cara feia.

— Desde quando seus funcionários palpitam em assunto de negócio, principalmente uma funcionária mulher que não sabe a diferença um café preto com açúcar e um café preto sem açúcar.

Meu pai me encara pelo canto dos olhos. Conheço esse diabólico olhar, sei, porque cresci com ele, sei, porque faço esse olhar quando vou tomar uma atitude louca, perversa ou quando quero acabar com alguém. Ele não dispensou esse idiota porque ele quer me ver agir.

Se ele quer me ver agir. Vamos agir.

Descruzo as pernas. Me ergo, em passos lentos, caminho até a mesa do meu pai, fico ao lado da cadeira dele e encaro o garoto nos olhos.

─ Primeiramente, não nasci para servir, nasci para ser servida. Não me importo se seu café tinha açúcar ou não, essa não é minha função, não sou uma funcionária qualquer, sou a herdeira Hernandes. ─ O menino engole a seco, vejo o corpo masculino se encolher. Isso me agrada.

Me agrada muito.

─ Não sei com que direito pegou o nome do seu tio e veio na cara de pau tentar se passar por ele, porém, não há tolos aqui, Douglas Ribeiro.

─ Se sabem que não sou meu tio, por que me atenderam?

─ Para ver ser era tão brilhante quanto seu tio. Mas nos enganamos, aliás, não sei se você sabe, contudo, bancos obtém lucro através de juros, e você chegar aqui e pedir um empréstimo de milhões de reais sem querer pagar juros, foi a maior piada que eu ouvi durante minhas cinco horas dentro dessas quatro paredes.

─ Mas eu ia pagar! ─ Exalta a voz.

Respiro fundo. Odeio que gritem comigo, principalmente sendo um idiota que duvida que uma mulher possa atingir cargos grandes como esse babaca a minha frente.

─ Não, você não ia pagar. ─ Forço um tom calmo. ─ E mesmo se pagasse, esse dinheiro não seria tão valioso. Como eu disse, trabalhamos com juros, ganhamos dinheiro com juros e mesmo você pagando o empréstimo muita coisa podem acontecer, o dinheiro pode desvalorizar, a inflação aumentar, muitos fatores podem acontecer e o juros é uma das coisas que neutraliza e vitaliza a estabilidade do banco.

A cada segundo a careta de Douglas aumenta. Vejo seu desespero, sua raiva por meus argumentos humilharem sua atitude fraca de conseguir dinheiro, não esconde a raiva e mesmo se quisesse, não conseguiria.

─ Não sei se ficou claro, então vou resumir: Não vamos lhe dar o empréstimo, isso significa que já pode se retirar.

─ Idiota! ─ Resmunga.

─ Como disse? ─ Finjo de desentendida.

Caminho até o garoto que ainda não se retirou da sala. Quero ver se terá coragem de me chamar de idiota novamente.

─ Pode repetir o resmungo?

─ Idiota! ─ Desafia minha paciência.

─ Esse termo é simples para mim, por que não se refere a mim como àquele garota que destruiu a construção da sua boate, ou melhor, me chame de senhorita Hernandes, desse modo, a raiva que senti por mim, fixará em sua mente toda vez que ouvir meu sobrenome. Agora, saía, cansei de perder saliva com você.

Dou as costas para ele. Ouço passos zangados, a porta se abre e se fecha bruscamente, provocando um barulho terrível.

─ Satisfeito?

─ Muito. ─ Meu pai esboça sorriso de lado.

─ Você não tem mais reuniões durante a tarde, então vou sair mais cedo. ─ Aviso, pego minha bolsa e a coloco sobre o ombro.

─ Rebeca ─ O encaro, mostrando estar ouvindo. ─ Estou orgulhoso de você.

Faço um movimento com a cabeça, reproduzindo um sutil agradecimento. Saio da sala, dou alguns passos e vejo Ulysses conversando com a secretária. E pela primeira vez no dia sorrio.