Capítulo 92

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Meu celebro liga o piloto automático, correspondendo atitudes que nem ao menos noto fazer, não faço ideia de como peguei o táxi, de como me apresentei na recepção do hospital, apenas consigo assumir o controle quando meus olhos encaram a Rebeca e ...

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Meu celebro liga o piloto automático, correspondendo atitudes que nem ao menos noto fazer, não faço ideia de como peguei o táxi, de como me apresentei na recepção do hospital, apenas consigo assumir o controle quando meus olhos encaram a Rebeca e minha mãe chorando, vejo meu pai sentado no chão tentando segurar as lágrimas. Inspeciono o semblante de Ulysses, não expressa dor, mas solidariedade, ele olha para Rebeca que, o segura como se ele fosse a cura.

Não preciso andar até lá para saber o que aconteceu. Não preciso dar nem se quer mais um passo para ouvir o lamentar da minha mãe pela morte do pai, não preciso chorar para demostrar a dor que martela meu peito, não me causando lágrimas, mas uma dor psicológica, que parece se instalar em mim, à medida que eu não tenha coragem de andar para ouvir os pêsames, os abraços de consolação.

Eu não permito acreditar que ele esteja morto. Não hoje, não depois que eu fiz pouco caso dos conselhos dele.

Sinto os braços da minha mãe passarem por meus ombros, sinto as lágrimas dela tocar minha pele e somente no momento que encontro seus olhos convenço ser verdade.

Ele se foi.

As lágrimas descem. A dor agonizante aperta meu coração. E as imagens de como o tratei, de como falei, são tapas e tapas em minha consciência perturbada.

O tempo passa, não sei quantos minutos, não sei quantos segundos, só identifico que o tempo passa, vejo minha mãe se erguer, limpar as lágrimas e assinar papeis, meu pai também se levanta e liga para a funerária, Rebeca permanece sem lágrimas, com os olhos vermelhos, com os braços em voltas do namorado, mas seus olhos, seus lindos olhos são voltados na minha direção.

Está na minha vez de levantar. Com dificuldade, quase sem forças coloco meus pés firmes, com passos determinados e apenas com um objetivo em mente: ver meu avô por uma última vez. Os médicos permitem a entrada, mas peço que meus pais esperem do lado de fora e eles entendem.

Nunca imaginei vê-lo sem um sorriso no rosto. Toco a pele que não há calor, balanço a cabeça em negativa, mas, no fundo, tentando assimilar, aceitar o luto... mesmo assim, não é fácil para uma alma culpada aceitar a partida de uma alma que recebeu o que não deveria.  

─ Vô... eu não queria... não queria que nossa última conversa tivesse sido daquele jeito. Me desculpe por ser rebelde, por abandonar o meu sonho de ser igual ao senhor, me desculpe por simplesmente desistir. ─ As lágrimas descem sem cessar. A cada palavra engulo uma pedra para soltar cada letra, é difícil pedir perdão a um corpo que não será capaz de responder. É difícil dizer adeus aquele que em horas atrás estava de dando uma lição sobre a vida. ─ Eu te amo. Sinto muito por ser um idiota. Eu só... só estava magoado por minhas próprias atitudes e supus que fugir, esquecer delas seria a melhor opção, mas eu sei que em meu lugar o senhor lutaria pelo amor dela, e só não sei se sou o melhor para ela.

Meus pais entram no quarto dizendo que os médicos precisam preparar o corpo, solto as mãos mortas daquele nunca mais o verei e saio. Saio andando sem rumo, apenas sigo pelos corredores que não sei onde vão dar, apenas caminho sem destino, sem nada para me parar a não ser passos rápidos atrás de mim. A voz séria de Rebeca me chama,  não tenho a capacidade de encara-la porque estou cego pela dor. Cego por saber que não o terei mais, que não ouvirei seus conselhos, que ele partiu.

─ Nathan! ─ Rebeca grita, puxando meu braço.

Lanço os olhos mais melancólicos na direção da menina que apenas coloca sua mão na lateral do meu rosto. Sua mão acaricia minha pele suavemente, sinto seu corpo se aproximar de centímetro a centímetro.

─ Foi o melhor. ─ A voz é baixa. Baixa, somente para que eu ouça, somente eu consigo ouvir tal besteira. Como a morte dele pode ter sido a melhor? Como?

Ela junta nossos corpos, num abraço que retribuo com toda força.

─ Eu agi feito um idiota com ele. ─ Confesso. Ela faz um barulho com a boca, mandando-me calar.

─ Às vezes a gente é idiota, mas não foque nisso, visualize as boas lembranças. Lembra-se da gente dançando na sua casa, das suas conversas com ele, se apegue as coisas boas, você melhor do que ninguém sabe que ele odiaria vê-lo sofrer, ou martirizando-se. ─ As mãos dela desliza por minhas costas, formando círculos. ─ Ele te amava e sabemos que nada que você possa ter feito fez com que ele diminuísse o amor dele por você. ─ A aperto ainda mais contra o meu corpo.

─ Obrigad...

─ Licença. ─ Um homem de olhos castanhos pede, ele faz sinal para sairmos da frente de um vidro que divide a gente de uma sala com alguns recém-nascidos. Rebeca se separa de mim e por motivo desconhecido, encara o homem que mantém um sorriso grande, muito grande nos lábios. ─ É aquele. ─ O homem aponta o dedo para um bebê. ─ Aquele é o meu menino. ─ Fala, orgulhoso.

─ Já escolheu o nome, meu filho? ─ Uma senhora coloca a mão sobre o obro do homem que continua a olhar fixamente para seu filho.
Ela confirma com um movimento com a cabeça.

─ Ele se chamará Caleb.

Os olhos de Rebeca se arregalam, mas um sorriso invade seus lábios, a mão dela entrelaça a minha e seguimos para a frente do vidro.

─ Senhor ─ Rebeca o chama. ─ Desculpe minha indelicadeza, mas ouvi sua conversa e quero lhe dar os parabéns. ─ O homem com felicidade recebe os parabéns. ─ Qual deles é o Caleb? ─ O homem aponta para o bebê a nossa frente. O pequenino bebê olha para mim, ele não chora como os outros, o bebê olha diretamente para mim, e em seus olhos encontro a mesma cor dos meus olhos, a cor que herdei do meu avô.

Nos afastamos um pouco do vidro. Rebeca me olha com a boca cheia de palavras, mas não consegue dizer nenhuma.

─ Será possível?

─ Caleb foi o nome que seu avô escolheu, os olhos dele são iguais aos seus. Se não for possível, nós dois estamos em choque e nosso cérebro está criando um universo paralelo para enfrentarmos a dor, essa é a única solução que consigo pensar.

─ Isso parece mentira.

─ Ayla e Caleb, isso parece possível para você?

─ Um amor que sobrevive mais de uma vida.

Será possível meu avô e minha avó terem reencarnado? Isso tudo parece loucura, mas, ao mesmo tempo, reconfortante.

Eu e Rebeca voltamos para o lugar onde vimos meus pais por uma última vez, minha mãe se encontra sentada olhando para o nada e meu pai ainda continua no telefone, Ulysses ao ver Rebeca se ergue e segue ao nosso encontro. Seus olhos direcionam a ela e o rosto dela estar melhor, na verdade, ambos estamos bem, pois pelo mais maluco que pareça eu vi meu avô. E talvez daqui a alguns anos eu o veja novamente sendo uma criança brincalhona, ou até mesmo um adolescente. 

─ Meus pêsames, Nathan. ─ Ulysses declara, esticando a mão em minha direção. Seguro na mão dele e com um leve aperto soltamos, agradeço e me despeço do casal, caminhando para o lado daquela que precisa de mim.

Abraço minha mãe e deixo que a chore em meu ombro. Depois de um tempo resolvendo as coisas sobre o corpo do meu avô e uma enfermeira entregou os pertences dele, e no meio do roupão, da calça, da camisa, encontro a pequena caixa. Abro e contemplo minhas alianças e no meio delas, encontro um pequeno papel escrito: Caso desista, nunca conhecerá realmente o amor. Então não desista, você merece conhecer o amor e ela merece ser amada. A valorize e lutem juntos para darem certos juntos. 

A caligrafia perfeita aquece meu coração e, ao mesmo tempo, entristece-me, pois sei que não terei mais seus conselhos. Mas de uma coisa eu tenho certeza, não desistirei dela, no primeiro deslize de Ulysses eu a conquistarei novamente, só que dessa vez, não serei idiota para perde-la

Entre o Amor e a AmizadeWhere stories live. Discover now