𝟕𝟓. " 𝑴𝒊𝒏𝒉𝒂 𝒍𝒊𝒏𝒅𝒂 𝒑𝒓𝒊𝒏𝒄𝒆𝒔𝒂, 𝒎𝒊𝒏𝒉𝒂 𝒆𝒔𝒑𝒐𝒔𝒂."

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                                Daniel

Quarta-feira, 5 de junho de 1957

 
“Prezado Senhor Daniel Magalhães,
  Peço desculpas antecipadas, caso minhas palavras não estejam corretas, mas eu nunca precisei fazer uma carta de demissão antes. Por favor, me perdoe se a minha saída é inesperada, porém não podia mais continuar nesse trabalho.
  Sou muito grato por terem me contratado, e senti que aqui se abriu uma porta muito importante. Quero que saiba que não estou saindo porque fizeram algo contra mim. Decidi que estava mais do que na hora de achar o meu rumo na vida.
   Quando vi todos encontrando alguém especial, enquanto o meu relacionamento ruiu, me dei conta de que precisava me afastar e refletir no que fazer daqui para a frente. Mais uma vez, me desculpe por qualquer transtorno. Torço para que o que contei não deixe uma má impressão ao meu respeito. Por favor, poderia não comentar isso com ninguém? Eu agradeceria muito.

Atenciosamente,
Samir Aboud Hasan.”

  Terminei de ler a carta dele, após um gole de café, enquanto minha esposa dormia profundamente ao lado. Depois da cena monstruosa que ela presenciou naquela casa, ainda teve de conversar com a polícia sobre o que houve.
  Coitada, não imagino como deve estar exausta disso tudo! Após o jantar, saiu para caminhar, querendo espairecer, e retornou ensopada, com uma cara estranha, tomando um banho e um calmante, dormindo depressa.
  Fiquei com muita pena do Samir, pelo seu abalo emocional, que nem sequer notei, nas poucas vezes que estive perto dele. Eu conheci a sua namorada no casamento do Miguel, e os dois pareciam entrosados, mas no meu casamento o clima não estava bom. Ele parecia evitá-la, e do altar notei que mal a olhava, aparentando aborrecimento, vez por outra encarando-me de um jeito esquisito.
   A verdade é que o Samir sempre fez isso. Deve ser vício da profissão, não sei. Pelo menos, foi o que a Sâmia afirmou, uma vez. Infelizmente, ele não teria a mesma sorte que tive, me casando com uma moça tão especial. Minutos depois, ela começou a se mexer e virou para mim, com o rosto amassado e o cabelo bagunçado de um lado.
  Sorriu na minha direção, limpado a saliva do rosto, levantando rápido, em direção ao banheiro, de onde voltou, pouquíssimo tempo depois, de banho tomado, ainda vestida com o roupão.
  Parecia bem descansada, o que me tranquilizou. Os preparativos pra a sua festa iam de vento em polpa, e fiquei feliz por vê-la animada.

— Bom dia, Daniel. — falou, ao dar-me um beijo suave.
— Bom dia, princesa. Como você está?
— Bem melhor. — respondeu, espreguiçando-se — Esses dias foram terríveis! Não paro de pensar na Madi. Ela está muito abalada com tudo que houve.
— Se quiser conversar sobre o que houve, eu...
— Não, tudo bem. Ela está mais abalada do que eu, tenha certeza. Mas obrigada pela atenção. — agradeceu, comum sorriso breve, marcando as covinhas.
— Certo, então. Ligaram mais cedo e avisaram sobre o funeral da sua tia. Será às 13 horas.
— Ainda não acredito que ela fez aquilo! Que horror! — soltou, triste — Bem, talvez o meu aniversário anime as coisas. Sabe, eu pensei em manter a minha festa na mansão, para tentar afastar esse clima ruim de lá. O que acha?
— Eu não sei se eles vão querer festejar lá, mas se é o seu desejo, podemos fazer como quiser. — respondi, tranquilo, e ela sorriu.
— Obrigada, querido! — agradeceu, abraçando-me — Nós não conseguimos ter uma noite de núpcias decente. — disse, acariciando o meu braço, após pegar um morango na bandeja e morder delicadamente, tingindo um pouco dos lábios com o sumo da fruta.
— Não tem que se preocupar com isso, Sâmia. — garanti, sentindo o calor chegando.
— Querido, não quero te deixar em falta. — falou, se aproximando, pegando a xícara da minha mão, devolvendo para a bandeja.
— Tem certeza? — perguntei, sentindo a minha boca secar.

Hasan    Where stories live. Discover now