Diário de Um Sobrevivente

08/12/18

Não acordei bem hoje, na verdade eu comecei a me sentir mal à noite e quase não consegui dormir por conta disso mas não tem nada a ver com os ferimentos ou as coisas que vem acontecendo, não é algo físico. Eu simplesmente estou mal.

É como aqueles dias que você acorda sem querer levantar da cama e atrasa o despertador várias vezes até se dar conta que seja lá o que fosse que você precisasse fazer já está atrasada de mais para conseguir. E então você só fica na cama, mas não por preguiça e sim por desanimo. Você se pergunta se o que você está fazendo é realmente o que você quer ou só está levando as coisas e vendo o tempo passar.

Eu não costumava ter tantos dias assim antes, talvez porque eu fosse um tanto ocupada e gostasse do que fazia mas hoje é difícil encontrar algo que me anime, sobreviver é um saco.

Eu sei que tenho meu irmão e esse grupo, que pra mim hoje é como uma família, mas por tudo que viemos passando a única coisa que consigo ver quando olho pra eles é uma contagem regressiva em cima de suas cabeças com o zero significando o fim de tudo e isso pesa de mais.

Todas as mortes, tudo que acontece a eles por mais que não seja minha culpa acaba me atingindo como se fosse e pra piorar a verdade é que pessoas morreram por minha causa, morreram pelas minhas mãos. Eu sei que aqueles caras mereceram e sempre que essa lembrança vem em minha mente é disso que eu tento me convencer, que eles mereceram aquilo, mas a verdade é que isso não muda o fato de que sou um assassina agora.

Eu tenho mudado com toda essa droga que vem acontecendo e não me vejo mais como a garota feliz e realizada que eu era na minha antiga vida e isso não é nada bom. Não é como "ah nossa agora sou uma pessoa mais forte" isso é papo furado, esse mundo não nos fortaleceu ele só vem nos destruindo pouco a pouco a cada dia.

Às vezes é difícil escrever aqui, é um alivio na maior parte do tempo mas às vezes é...

Larguei o diário um pouco de lado e fui falar com meu irmão. Ele estava mexendo nos carros e os motores precisam de óleo e algumas peças novas ou então teremos que arrumar outros carros se não quisermos ficar a pé.

Eu estava no carro lendo um pouco do diário quando meu irmão apareceu pela janela do passageiro. Ele apoiou os braços na janela e falou:

- Nós vamos voltar na cidade.

- O quê?

- Os carros precisam de reparo e aquela cidade é o lugar mais próximo que conhecemos.

- Você só pode tá brincando comigo.

- Izabel nós precisamos dar um jeito nos carros. Se eu não voltar naquela cidade talvez não iremos mais a lugar nenhum.

- "Você voltar" ou "nós voltarmos"?

- "Nós voltarmos" mas isso não inclui você. – Ele disse e logo após se afastou do carro.

Desci do carro e fui atrás dele.

- Não dê as costas pra mim. Por que me trata como se eu fosse uma criança?

Ele se virou e olhou para mim com um ar de desaprovação porém não disse nada. Então eu continuei:

- Sua super proteção já tá me cansando.

- E o que você quer fazer lá? Isso não é uma missão Izabel. Não é um jogo. Não é um desafio de quem é o mais durão. Olhe pra você, veja as coisas que aconteceram, olha seu estado. Você foi baleada, quase foi morta várias vezes, um maldito mordedor quase te pegou, o que diabos você está tentando provar?

- Do que você ta falando? Eu fiz isso pelo grupo, foi para ajudar as pessoas.

Nossas vozes já estavam altas nesse momento e quando menos percebemos isso já tinha virado uma discussão.

- É? Porque parece que você só está fazendo isso pra se sentir capaz de escrever naquela droga de caderno.

Assim que ouvi isso a única coisa que pude fazer foi acertar uma tapa em cheio no rosto do meu irmão. Quando ele virou o rosto de volta pra mim ainda tive tempo de olhar em seus olhos antes de dar as costas pra ele e sair dali.

Não ouvi mais nenhuma palavra dele e nem de ninguém depois disso passei rápido no carro para buscar o diário e quando saí ouvi Castilho me chamar:

- Izabel o que aconteceu?

- Não enche. – Falei rude com ele. Não deveria ter feito isso.

É..eu devia jogar essa droga de caderno fora.