30/11/2018(Continuação)

628 42 10
                                    


Assim que desci a escadas e entrei no apartamento onde todos estavam perguntei: - Pra onde vamos?

- Pro litoral. – Barbara respondeu.

- Atrás da nossa família. – Edinho concluiu.

Mal acreditei quando ouvi aquelas palavras. Não sei o quanto aquela discussão com Edinho influenciou nessa decisão dele, na verdade não sei sequer se aquilo influenciou em algo, mas não me importa. O que importa pra mim agora é que apesar dos pesares voltaremos ao caminho de encontro a nossa família.

Pegamos algumas tralhas nos apartamentos, coisas que poderiam nos ajudar: algumas garrafas, pilhas, um pacote de milho de pipoca e eu também peguei um relógio de pulso maneiro que vi sobre uma cômoda no apartamento do primeiro andar onde eu tava. Com as malas prontas e tudo em ordem fomos pro carro e seguimos caminho.

Barbara era quem conduzia o carro e Edinho ia no banco do passageiro ao seu lado enquanto eu e Natalia estávamos no banco de trás. Barbara parecia não saber muito bem por onde ir e passou a fazer um caminho meio estranho, entrando em várias ruas paralelas e fazendo retornos sem muito sentido. Dessa vez seguíamos caminho calados, diferente das últimas vezes em que andamos no carro, então eu preferi não me meter apesar de já estar me sentindo incomodado com aquilo.

O clima entre nós não estava muito bom e atmosfera no carro era bem mais densa que a habitual. Recostei a cabeça no vidro da janela e com o balançar do carro passei a quase cochilar enquanto apenas observava Barbara a dirigir e conversar com Edinho para decidirem por onde seguir.

E nesse ritmo o tempo foi se passando, na mesma velocidade em que eu via os postes passarem por nós e ficarem pra trás. Aquele momento de silencio não demorou pra se tornar um momento de reflexão e eu passei a pensar em como faria pra encontrar minha família e meu grupo. Pensei no que faria ao revê-los, no abraço que daria na minha mãe, no beijo que eu daria em Izabel e... No meu pai.

Eu não queria pensar sobre ele por que eu não quero aceitar o que deve ter acontecido. Eu sei que ele não sobreviveria àquele ferimento se não tivesse o devido tratamento e eu sei que apesar da minha mãe ser uma ótima enfermeira, não teria como ela salvá-lo sozinha, mas eu não quero aceitar isto.

O pior de tudo é que na verdade tudo isso aconteceu por minha causa, tudo isso é minha culpa. Se eu não tivesse revidado contra o desgraçado do Wendell meu pai não teria sido baleado, nosso grupo não precisaria ter se dividido, Edinho não teria sofrido o acidente e eu não precisaria abandonar a todos pra salvá-lo, ou na verdade, simplesmente morrer junto com ele.

Eu imagino como foi pra eles descobrirem que a merda do navio na verdade não existe. Penso como minha mãe está precisando lidar com todas essas perdas ao mesmo tempo, o que deve tá se passando na cabeça dela? E de Izabel? Igor? Será que eles pensam em nos encontrar tanto quanto eu e Edinho pensamos em revê-los? Ou Igor já os convenceu da lógica de estarmos mortos? Eu não o culparia por isto, na situação em que eu os deixei nem eu mesmo acreditava que sairia vivo.

Como droga eu vou fazer para encontrá-los? Mas que merda, minha cabeça está tão confusa. Fico perdido entre os meus pensamentos até que algo me traz de volta... É um som. Um som que eu já me habituei a ouvir, um som que me persegue há bastante tempo, um som que normalmente precede algo ruim, eu sei que som é esse... São disparos.

Aquilo me tira imediatamente do transe em que eu me encontrava e me faz dar um pulo no banco do carro tirando minha cabeça do vidro e me colocando a procura da origem dos tiros.

Ouvi gritos, o barulho de mais janelas quebrando e o som das balas acertando a lataria do carro. Era possível ouvir o zunido das balas que atravessavam o interior da cabine, raspando a poucos centímetros da minha cabeça.

Diário de Um SobreviventeOnde as histórias ganham vida. Descobre agora