13/12/2018

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Acabei adormecendo recostado sobre o balcão sujo do bar e só acordei com os toques de Barbara no meu ombro.

- Está tudo bem com você?

- Eu é quem deveria perguntar. – Falei coçando os olhos.

- Estou sim. Desculpe-me por ontem.

- Não há porque se desculpar. O que importa é que estás bem. – Parei a falar para um bocejo e continuei. – Onde está Edinho?

- Conferindo o carro.

Barbara se sentou ao meu lado e eu puxei o saco a minha frente onde estava o resto da pipoca, então passei a dividi-lo com ela desta vez. Quando terminamos de comer Edinho entrou pela porta dos fundos e já anunciou que tudo estava bem com o automóvel.

Barbara questionou se queríamos voltar para conferir o que houve mas acabou ficando decidido que não o faríamos. Apesar de ter gasolina o suficiente pro percurso nós não queremos arriscar de nos deparar com o bando de zumbis que quase nos encurralou.

Após conversarmos mais um pouco ficou decidido que continuaríamos caminho ao sul como o previsto e de lá rumaremos ao interior. Pelo visto nossas preocupações com a segurança estão se mostrando de fato necessárias, o mundo está ficando cada vez mais perigoso.

Antes das 10 da manhã nós deixamos pra trás aquele bar velho e caímos na estrada. Dia após dia feito nômades, largando um lugar após o outro e buscando um novo sempre numa vã esperança de salvação. Antes eu achava desgastante mas não importava tanto pois apesar de tudo eu estava feliz em estar entre meus amigos e familiares, só que hoje o sentimento não é mais o mesmo.

Quando procurávamos um local seguro quando saímos de João pessoa, no começo eu realmente pensei que encontraríamos, só que depois de um tempo percebi que era estupidez nossa mas eu não importava. O importante para mim era convencer as pessoas a acreditarem em algo que nem eu sequer acreditava mais e era isso que me mantinha de pé.

E hoje eu não sei mais o que vai continuar me fortalecendo. Tudo que vem acontecendo só vem me prejudicando e eu não sei a qual ponto eu irei continuar a agüentar ou acabarei por ceder. Quando eu e Edinho começamos a busca atrás da nossa família eu estava certo que os encontraria, assim como quando saí de João Pessoa eu tinha certeza de que encontraríamos um local seguro, só que a cada baque que levamos eu perco parte desta certeza e não sei o que pode preencher o lugar dela para me manter vivo.

O que não nos mata nos fortalece, de certa forma é verdade. Eu me sinto muito mais duro hoje do que eu era quando tudo começou porém esqueceram de dizer no ditado que o tal fortalecimento só vem por fora. Seu corpo fica mais resistente mas sua alma se apaga, meu corpo se mantém vivo e quem eu era morre a cada golpe que levo e preciso me reerguer. Não sei o quanto mais tenho pra perder antes de me tornar algo que nem eu mesmo consiga reconhecer.

O que não me mata neste mundo não está me fortalecendo, pelo contrário, no fim das contas o que não me mata aqui apenas me enfraquece e me deixa vulnerável para que mais coisas possam me matar.

Divaguei nos meus pensamentos por horas a fio ao ponto de nem sequer perceber pra onde íamos ou por quanto tempo seguimos. Voltei a mim com Edinho batendo no meu braço.

- Ei, hora de acordar.

Passei a mão no rosto para recompor meus sentidos e atenção e olhei pra Edinho que prosseguiu.

- Vamos parar nesse posto aí pra passar a noite. Tem uma cidade pouco a frente e eu quero dar uma olhada nela antes de partimos.

Assenti com a cabeça ainda um pouco sonolento e desatento e saí do carro logo depois. A brisa fria do fim de tarde me fez passar as mãos pelos braços e acordar de vez.

- Vai fazer isto agora? – Perguntei a ele.

- Ir à cidade? Não. Vamos fazer pela manhã todos juntos, a noite já está quase a cair não vai valer a pena se arriscar se não conseguirmos ver nada.

- Verdade.

- Tá tudo limpo lá dentro, meninos. - Barbara disse chegando sem que eu nem ao menos a visse.

- Ótimo, vamos. – Edinho falou carregando uma das mochilas enquanto Barbara puxava as outras do banco de trás.

Comecei a caminhar em direção ao posto e Edinho me interrompeu puxando meu ombro.

- Está tudo bem com você?

- Sim, está. Não se preocupe.

- Tem certeza? – Senti o ar de preocupação em sua expressão.

- Sim. – Falei e confirmei com a cabeça.

- Ótimo. – Barbara disse atrás de nós. – Então ajude-me com as mochilas.

Diário de Um SobreviventeWhere stories live. Discover now