11/12/2018(Continuação)

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Com o homem já livre, Edinho o levantou pela camisa e o jogou pro outro lado do quarto. O infeliz acertou com tudo as portas de um antigo armário e cambaleou para trás, então Edinho correu com tudo em sua direção e o empurrou com toda a força pela janela do segundo andar.

O homem despencou com tudo batendo numa cerca pontiaguda e depois aterrissando já sem vida no chão.

Eu ainda não havia conseguido digerir o que acabara de ouvir e pelo jeito que Edinho me olhou, ele também não.

Edinho ficou em um modo quase que estático e parecia alheio as coisas a sua volta. Aquilo obviamente mexeu profundamente com ele, muito mais do que a mim, pois era da filha dele que o homem falava. Eu sabia que Edinho não estava bem e sabia também que deixá-lo sozinho por um tempo seria o melhor a ser feito, ele precisa de tempo e espaço agora.

Temo as reações que ele possa tomar, na verdade neste momento me preocupo tanto com ele que cheguei a deixar de lado a minha própria necessidade de me enfurecer com o ocorrido. Em outros momentos seria eu o primeiro a querer enfrentar quem quer que fosse por conta da minha família, mas hoje eu vejo que não posso simplesmente me dar ao luxo de seguir apenas o coração.

Edinho que sempre foi a peça racional e centrada próximo de mim, pelo menos por agora não consegue mais manter esta posição, então cabe a eu tomá-la e evitar que ele se ferre assim como ele evitou tantas vezes que eu me desse mal.

É difícil se manter racional numa hora dessa e conseguir analisar tudo com clareza, admito que sozinho eu provavelmente não conseguisse, mas Barbara entrou para equilibrar as coisas.

Deixamos Edinho sozinho no quarto e saímos os dois juntos de lá ainda calados e permanecemos assim por um tempo. Eu sabia que minha cara não estava muito boa, mesmo eu tentando disfarçar o que se passava comigo, e Barbara não demorou a perceber.

- Sua expressão não está muito diferente da do seu tio.

- Oi? – Eu estava tão preso nos pensamentos de como lidar com aquela situação que mal a ouvi.

Barbara ignorou minha falta de atenção e prosseguiu: - Não me diga que você está pensando no mesmo que ele.

- Você ouviu o que aquele desgraçado falou. Não é fácil simplesmente não fazer nada a respeito.

- Eu sei. E se foi exatamente por isso que ele falou?

- Como assim?

- Aquele homem continuaria sendo torturado por Edinho até que falasse alguma coisa que ele quisesse ouvir. Ele não tinha escapatória, ou você acha que ele pensava que sairia vivo daqui?

- E o que isso tem a ver? Ele sabia também que seria morto depois de falar aquilo sobre Heloíse. Principalmente dizendo a Edinho e daquela forma que disse.

- Exato. De qualquer forma ele morreria...

- E falou aquilo só pra adiantar o processo? – Me adiantei interrompendo a conclusão de Barbara.

- Não só por isso, mas também para conseguir matar todos nós.

Olhei pra Barbara ainda sem entender muito bem e ela continuou a linha de raciocínio.

- Se ele simplesmente morresse sem falar nada nós não daríamos à mínima e seguiríamos em frente, mas falando aquilo...

- Ele usaria nossa raiva para nos fazer atacar seu grupo de qualquer maneira e nos ferrarmos. – Completei.

- Exato.

- Eu entendi. E que como fazemos para convencer Edinho disso?

- Damos um tempo pra ele esfriar a cabeça e tentamos.

- A cabeça dele não vai esfriar assim... – Conclui enquanto me afastava e seguia uma direção contrária a de Barbara.

Tudo o que Barbara falou fazia muito sentido e pensando bem eu comecei a acreditar que de fato ela está certa, só que conseguir convencer Edinho do mesmo deverá ser bem mais difícil. Ele permaneceu no quarto desde àquela hora e eu não sei se é melhor ir até lá logo e evitar que ele alimente mais sua raiva ou esperar que ele consiga por a cabeça no lugar e venha falar conosco.

As horas foram passando lentamente enquanto cada um de nós permanecia isolado em cada canto da pousada. O silencio mórbido se alastra por todos os cômodos e isso só me faz sentir pior. Estou cansado físico e psicologicamente, me sinto fraco, estou faminto, sujo e irritado. A pressão dos últimos dias está ultrapassando o limite da minha sanidade e em momentos solitários como este eu penso em quantos golpes ainda conseguirei agüentar.

A indecisão e insegurança sobre qual direção tomar me aflige. Se escolhermos a opção errada, se eu errar o próximo passo isso pode nos afastar de vez da nossa família, e este é um peso grande de mais para eu carregar sobre os ombros de novo.

Não suportava mais remoer estes pensamentos na minha cabeça e senti que precisava agir senão aí sim acabaria perdendo o controle de vez. Levantei-me e saí do quarto em direção ao aposento onde Edinho estava, dei três batidas leves na porta e entrei.

- Precisamos conversar. – Falei assim que dei o primeiro passo dentro do quarto. Edinho estava de pé ao lado da janela quebrada observando o corpo do homem ao chão.

- Fale.

- Eu sei como você está se sentindo e...

- Não. – Edinho se virou para mim. – Não. Você não sabe.

- Você quer ir lá e matar todos eles. Quer se vingar, trazer Heloíse de volta. Eu entendo.

- Eu não vou só matá-los, vou fazê-los sofrer primeiro. Vou fazê-los pagar por tudo que fizeram a ela, a Natalia, a mim, a você e a toda nossa família.

- Eu sei. Eu sei. – Falei levantando as mãos a altura do peito. – Mas você precisa pensar.

- Eu conheço esse tom de voz, Jotah. Você quer me convencer a não atacá-los, não é?

Antes que eu pudesse responder ele continuou

- Cadê o homem determinado e valente que disse a mim que caçaria todos aqueles desgraçados há alguns dias? Você amoleceu depois de ser baleado? Agora você não quer mais atacá-los, por medo ou porque não foi o nome da sua amada Izabel que aquele filho da puta pronunciou? – Edinho disse com raiva se aproximando de mim.

- Já chega. Você acha que eu não sei o que disse? Acha que eu não sei o que eu faria no seu lugar? Você sabe que se fosse comigo eu já teria partido com tudo pra cima deles mas você não é como eu, e não pode ser.

Minhas palavras fizeram com que ele parasse por um segundo e naquele instante eu percebi que ele estava de fato me ouvindo e não só colocando sua raiva pra fora.

- Barbara disse algo que faz muito sentido. – Aproveitei o momento para dizer aquilo que queria. – Ela acha que aquele desgraçado estava blefando conosco. Ele não fez nada daquilo com Heloíse, nem ao menos devia estar com ela, falou apenas para nos enfurecer e fazer exatamente isso que está acontecendo.

Edinho deu um passo para trás e levou uma das mãos a cabeça, eu vi que ali ele estava refletindo bem sobre o que eu disse e pelo seu olhar percebi que ele também via sentido na hipótese de Barbara.

- E se isso não for verdade? E se ela estiver errada? – Edinho me indagou.

- Eu não sei.

- Não podemos simplesmente partir, vamos investigar isto primeiro. Precisamos ter certeza que nem Heloíse, nem sua mãe, Izabel ou qualquer outra pessoa da nossa família estejam com eles.

Edinho enfim demonstrava ter voltado a raciocinar como de costume e isso foi fantástico para mim.

- Precisamos perguntar a Barbara primeiro se ela aceitar se arriscar conosco nessa.

- Eu aceito. – Ouvi a voz de Barbara vindo da porta atrás de mim.

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