Capítulo 37

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Tantas pessoas... Afastei-me sorrateiramente e comecei a caminhar pelos trilhos no fundo do jardim em busca de sossego. Eu só precisava de um pouco de ar fresco para me sentir melhor. Após caminhar um tempo entre as árvores, notei uma figura familiar de pé próximo a uma árvore, balançando as mãos no ar.

Mesmo na escuridão da noite, a figura solitária daquela garotinha chamou a minha atenção. Aproximei-me silenciosamente enquanto vislumbrava melhor o seu perfil e os movimentos que fazia. Ela olhava para o alto completamente perdida em algo.

Coloquei-me de frente para ela analisando com cuidado os movimentos de suas mãos enquanto compreendia o perfeito padrão que desenvolvia. Apesar de eu invadir seu espaço, ela me ignorou completamente.

"É estranho! Ela não nos vê?" — Perguntou Lisa. Sorri enquanto negava essa afirmação.

"Não, ela é como eu. Não vê? Está compondo!"

Após um tempo analisando, elevei minhas mãos e acompanhei sua melodia tocando-a mentalmente e percebendo a forma triste como ela soava. Era como se eu pudesse sentir cada lágrima que afogava o coração dela.

Foi só então que ela desceu o olhar me encarando diretamente e parando o que estava fazendo. Seus olhos claros continham um brilho confuso enquanto analisava minhas mãos balançando, continuando a repetir a melodia que ela desenvolvera. Sorri para ela ao término do tempo, mas ela não reagiu.

— Quem é você? — Perguntei curiosa. Ela não respondeu, mas parecia atenta. — Meu nome é Eliza, é um prazer conhecer você! Sua melodia é linda, mas é um pouco triste.

Ela recuou um passo me encarando com ainda mais atenção e então começou a mover as mãos novamente, simulando a mesma melodia.

— Sim, essa melodia! Eu consigo entendê-la. — Embora não dissesse nada, senti que queria uma confirmação, mas meras palavras não poderiam fazê-lo. Encantada com os sentimentos dessa melodia, como eu poderia não a materializar? — Poderia me emprestá-la um pouco? Acho que se encaixa bem com uma das canções que estou escrevendo.

Ela assentiu vagarosamente. Com a boca ainda fechada, comecei a soar a melodia testando-a com o encaixe da letra em minha cabeça. O olhar da garota aos poucos se transformou, de um poço profundo a um lago reluzente. Quando me senti segura, me deixei levar soltando a voz e deixei que a triste melodia ecoasse no ar.

"Esse vazio e solidão penumbram

Tal como a semente se enraíza no chão,

este sentimento se agarrou ao meu coração,

O tempo corre enquanto vira as estações

Mas continuo presa a essas tristes emoções

Quando a chuva cai sei que posso chorar,

Mas as nuvens se vão para o sol poder raiar,

A esperança aos poucos cresce, ela eu vou cultivar,

Para que um dia eu sorria, quando livre estar."

Lágrimas escorriam pelos olhos da garota enquanto abria os braços e se jogava contra mim. Por algum motivo, essa garota me atraíra a atenção desde o primeiro momento que a vi, talvez porque eu visse a mim mesma nela. Já fui uma criança incompreendida e solitária, uma alma invisível no meio de uma multidão de pessoas.

Aceitei o abraço da garota e deixei que desatasse em lágrimas. Não sei bem o que ela fazia aqui, mas naquele momento senti no fundo do meu coração que ela precisava da minha atenção. Envolvi meus braços em torno dela com força retribuindo o abraço enquanto sussurrava em seu ouvido.

Destino: O herdeiro AlfaWhere stories live. Discover now